quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Mercado de Trabalho no Brasil

Um tema importante e pouco debatido é o estudo do mercado de trabalho no Brasil. Recente estudo do Dieese aponta que o mercado de trabalho no país é bastante heterogêneo, com grandes variações de remuneração, condição de trabalho e proteção social.

Esse estudo indica alguns tipos precários de relações de trabalho: 1) empregos com carteira mal remunerados; 2) empregos sem carteira; 3) desemprego; 4) pequeno comércio de rua; 5) cooperativas; 6) empregos temporários; 7) terceirizados e 8) clandestinos ou ilícitos.

O problema desse amplo e diferenciado espectro de relações de trabalho é que a legislação brasileira que trata dos direitos sociais se estrutura principalmente a partir dos trabalhadores assalariados. E o contigente sem carteira assinada, segundo o IPEA, é de 15,3 milhões de trabalhadores, 28,2% dos empregados (dados de 2011*)

Ocorre que mesmo no mercado formal de trabalho a situação não é boa. O Ministério do Trabalho produz mensalmente estatística sobre os empregos com carteira assinada e desemprego (Caged - Cadastro Geral de Emprego e Desemprego).

Pelo Caged fica-se sabendo que a grande maioria dos empregos criados com carteira assinada se concentra na faixa até dois salários mínimo (saldo de 1,92 milhões de janeiro a setembro deste ano). Empregos acima de dois mínimos, no mesmo período, tiveram saldo negativo de 140 mil empregos.

Tudo isso mostra que o país tem um longo caminho a percorrer para ter um mercado de trabalho robusto, qualificado e bem remunerado. Apesar de ter gerado 17.626.016 empregos formais de janeiro de 2003 a outubro de 2011 e manter baixas taxas de desemprego, há um preocupante nivelamento por baixo nos salários praticados no Brasil.

A política de valorização permanente do salário mínimo, aprovada no governo Dilma, dá sequência a uma das mais importantes vitórias dos trabalhadores brasileiros de recuperação salarial. No entanto, devido a gigantesca rotatividade em curso no país, o patronato procurar driblar essa conquista.

O professor de Economia da Unicamp, Cláudio Dedecca, afirma, com razão,  que as empresas demitem quem ganha mais e contrata trabalhadores com salários menores para não arcar com os custos da elevação do salário mínimo (e também para fugir dos aumentos reais alcançados nas convenções e acordos coletivos).

Essa matéria é central quando se discute os rumos do desenvolvimento do país. O Brasil reclama por um pacto desenvolvimentista entre o trabalho e o setor produtivo contra os ganhos exacerbados do setor financeiro. Mas é necessário dar principalidade à questão do trabalho de qualidade.

O movimento sindical brasileiro precisa descortinar novas estratégias para enfrentar um mercado de trabalho complexo, onde coexistem relações formais e informais com fronteiras não muito nítidas. Além disso, deve colocar no topo da agenda a luta por trabalho de qualidade e bem remunerado.

(*) dado atualizado

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Celac: Declaração de Caracas

Abaixo um dos três documentos aprovados na reunião da CELAC - Comunidade dos Estados Latinoamericanos e Caribenhos, realizada em 2 e 3 dezembro na Venezuela. Os outros documentos são o "Plano de Ação de Caracas" e "Estatutos de Procedimentos".


Declaração de Caracas

 “No Bicentenário da Luta pela Independência, Percorrendo o Caminho de Nossos Libertadores”

1. Os chefes de Estado e de Governo dos países da América Latina e do Caribe, reunidos em Caracas, República Bolivariana da Venezuela, em 2 e 3 de dezembro de 2011, no âmbito da III Cúpula da América Latina e do Caribe sobre Integração e Desenvolvimento (CALC) e da XXII Cúpula do Grupo do Rio, no ano da comemoração do Bicentenário da Independência da Venezuela e em memória e homenagem à transcendental obra histórica do Libertador Simón Bolívar, resolvem:

2. Reconhecer a valiosa contribuição do Mecanismo Permanente de Consulta e Concertação Política –Grupo do Rio–, criado em dezembro de 1986 no Rio de Janeiro, à respeito dos temas principais da agenda regional e global e agindo em favor das maiores aspirações de nossos países, bem como o impulso brindado à cooperação, à integração e ao desenvolvimento da região por parte da CALC, criada em dezembro de 2008, em Salvador da Bahia, Brasil;

3. Reafirmar a Declaração da Cúpula da Unidade da América Latina e do Caribe (Riviera Maya, México, 23 de fevereiro de 2010) e, particularmente, a decisão de constituir a Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (CELAC), que compreende os 33 Estados soberanos da nossa região;

4. Saudar a criação do Fundo Unificado CALC e do Grupo do Rio de composição aberta, copresidido pelo Chile e pela Venezuela, o qual promoveu a maravilhosa tarefa de redigir o documento de procedimentos da CELAC, cumprindo assim de forma efetiva com a Declaração Ministerial de Caracas de 3 de julho de 2010;

5. Reconhecer as importantes conquistas e os consensos atingidos nas reuniões dos Ministros das Relações Exteriores realizadas em Caracas, durante julho de 2010 e abril de 2011, bem como nas reuniões ministeriais especializadas nas áreas social, ambiental, energética, financeira e comercial, no âmbito da Presidência venezuelana da CALC;

6. Conscientes dos desafios que a crise econômica e financeira internacional apresentam para o futuro de nossa região e para nossas legítimas aspirações de inclusão social, crescimento com equidade, com desenvolvimento sustentável e com integração;

7. Convencidos de que a unidade e a integração política, econômica, social e cultural da América Latina e do Caribe constitui, além de uma aspiração fundamental dos povos que estamos representando, uma necessidade para enfrentar com sucesso os desafios que temos diante de nós como região;

8. Conscientes de que a comemoração do Bicentenário dos processos de Independência na América Latina e no Caribe oferece o contexto propício para a consolidação e o início de nossa Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (CELAC);

9. Decididos a promover e projetar uma voz comum da América Latina e do Caribe na discussão dos grandes temas e nas posições assumidas pela região perante acontecimentos importantes em reuniões e conferências internacionais, bem como na interlocução com outras regiões e países;

10. Reconhecer que nossos países têm avançado nos processos de integração regional e subregional e na conformação de diferentes mecanismos ao longo das últimas décadas, como reflexo de sua vocação de unidade e sua natureza diversa e plural, mecanismos que constituem um alicerce sobre o qual edificamos a Comunidade que reúne todos os Estados latino-americanos e caribenhos;

11. Tendo consciência do desejo comum de construirmos sociedades justas, democráticas e livres, e convencidos de que cada um de nossos povos vai escolher as vias e os meios para poder realizar esses ideais, baseados no pleno respeito aos valores democráticos da região, ao estado de direito, a suas instituições e procedimentos e aos Direitos Humanos;

12. Ratificar nossa adesão aos propósitos e princípios expostos na Carta das Nações Unidas e ao respeito pelo Direito Internacional;

13. Assinalar o caminho traçado pelos Libertadores da América Latina e do Caribe há mais de duzentos anos, um caminho iniciado de forma efetiva com a independência do Haiti em 1805, comandada por Toussaint Louverture, constituindo-se assim como a primeira República Independente da região. Da mesma forma, lembramos que a República do Haiti, liderada por seu presidente Alexandre Pétion, por meio da ajuda brindada a Simón Bolívar para a independência dos territórios que atualmente conhecemos como América Latina e o Caribe, colocou as bases para a solidariedade e a integração entre os povos da região;

14. Inspirados na obra dos Libertadores e assumindo plenamente seu legado como patrimônio fundacional de nossa Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos;

15. Conscientes de que já passaram 185 anos desde que foi ensaiado o grande projeto dos Libertadores para que hoje a região se encontre em condições de enfrentar, devido à experiência e à madureza adquirida, o desafio da unidade e da integração da América Latina e do Caribe;

16. Inspirados no Congresso Anfictiônico do Panamá de 1826, ato de fundação da doutrina da unidade latino-americana e caribenha, onde nossas jovens nações colocaram a questão sobre os destinos da paz, o desenvolvimento e a transformação social do continente;

17. Apontando a participação dos povos indígenas e afrodescendentes nas lutas independentistas e reconhecendo as contribuições morais, políticas, espirituais e culturais para a constituição de nossas identidades e para a construção de nossas nações e processos democráticos.

18. Reconhecendo o papel histórico dos países da Comunidade Caribeha (CARICOM) no processo de liberação, desenvolvimento e integração na América Latina e n Caribe, e enfatizando o compromisso permanente da CARICOM e dos povos caribenhos para contribuir com o desenvolvimento integral e sustentável da região;

19. Sublinhando a comemoração do Bicentenário da Independência, os países latino-americanos e caribenhos honramos a memória de nossas lutas de independência e reafirmamos o pensamento integracionista (Costa Rica e Honduras) que defenderam nossos heróis e heroínas.

Declaramos:

20. Que, no âmbito do Bicentenário da Independência, os 33 países da América Latina e do Caribe reunimo-nos, após os esforços concretizados na Cúpula da América Latina e do Caribe (CALC) realizada em 17 de dezembro de 2008 em Salvador de Bahia e na Cúpula da Unidade efetuada em Cancun em 23 de fevereiro de 2010, a fim de pôr em andamento a Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (CELAC);

21. Que, de acordo ao mandato originário de nossos libertadores, a CELAC deve avançar no processo de integração política, econômica, social e cultural com um sábio equilíbrio entre a unidade e a diversidade de nossos povos, com o objetivo de que o mecanismo regional de integração seja o espaço idôneo para a expressão da nossa rica diversidade cultural e, por sua vez, seja o espaço adequado para reafirmar a identidade da América Latina e do Caribe, sua história comum e suas lutas contínuas pela justiça e pela liberdade;

22. Que, levando em conta a diversidade nos processos de formação da identidade latino-americana e caribenha, a CELAC deve se tornar um espaço que reivindique o direito à existência, preservação e convivência de todas as culturas, raças e etnias que habitam nos países da região, bem como o caráter multicultural de nossos povos e o caráter pluricultural dalguns de nossos países, especialmente das comunidades originárias que promovem e recriam a memória histórica, os saberes e os conhecimentos ancestrais;

23. Que, reconhecendo o direito que possui cada nação para construir em paz e livremente seu próprio sistema político e econômico e no âmbito das instituições correspondentes, de acordo com o mandato soberano do povo; os processos de diálogo, intercâmbio e negociação política que sejam ativados a partir da CELAC devem ser realizados levando em conta os seguintes valores e princípios comuns: o respeito ao Direito Internacional, a solução pacífica de controvérsias, a proibição do uso e da ameaça do uso da força, o respeito à autodeterminação, o respeito à soberania, o respeito à integridade territorial, a não-ingerência nos assuntos internos de cada país e a proteção e promoção de todos os Direitos Humanos e da democracia;

24. Baseados nos valores e princípios do parágrafo anterior e levando em conta as práticas do Grupo do Rio, a CELAC promoverá o desenvolvimento de instrumentos para garantir o comprimento desses valores e princípios;

25. Que é necessário continuar unificando esforços e capacidades para impulsionar o desenvolvimento sustentável da região, concentrando os esforços no crescente processo de cooperação e integração política, econômica, social e cultural para contribuir, desta maneira, com a consolidação de um mundo multipolar e democrático, justo e equilibrado, e em paz, sem o flagelo do colonialismo e da ocupação militar;

26. Que é necessário aprofundar a cooperação e a execução de políticas sociais para reduzir as desigualdades sociais internas a fim de consolidar nações capazes de cumprir e ir além os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio;

27. A necessidade de avançar, sobre a base de nossos princípios, no fortalecimento e consolidação da cooperação latino-americana e caribenha, no desenvolvimento de nossas complementaridades econômicas e na cooperação Sul-Sul, como eixo integrador de nosso espaço comum e como instrumento de redução de nossas assimetrias;

28. Que a CELAC, único mecanismo de diálogo e acordo que agrupa os 33 países da América Latina e do Caribe, é a maior expressão de nossa vontade de unidade na diversidade, e onde, daqui por diante, serão fortalecidos nossas relações políticas, econômicas, sociais e culturais na base de uma agenda comum de bem-estar, paz e segurança para nossos povos, com o objetivo de consolidar-nos como uma comunidade regional;

29. Que a Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (CELAC), tendo presente o acervo histórico do Grupo do Rio e da CALC, impulsionará planos de ação para a implementação e o cumprimento dos compromissos estabelecidos nas Declarações de Salvador da Bahia e de Cancun, no Plano de Ação de Montego Bay e no Programa de Trabalho de Caracas;

30. Honrando o processo histórico vivido, os Chefes de Estado e de Governo dos países da América Latina e do Caribe decidem:

31. Adotar, baseados nos princípios de flexibilidade e participação voluntária das iniciativas, as declarações e documentos aprovados na Reunião Ministerial Especializada sobre Desenvolvimento Social e Erradicação da Fome e da Pobreza, celebrada em Caracas em 24 e 25 de março de 2011; na Reunião de Seguimento e Avaliação dos Avanços do Foro dos Ministros do Ambiente, Caracas, 28 e 29 de abril de 2011; na Reunião Ministerial sobre Energia, Caracas, 12 e 13 de maio de 2011; na Reunião Ministerial sobre a Crise Financeira Internacional e Comércio Exterior, Caracas, 18 e 19 de maio de 2011; na Reunião entre Mecanismos Regionais e Subregionais de Integração na América Latina e no Caribe no âmbito da CALC, Caracas, 25 e 26 de outubro de 2010; na Reunião entre Mecanismos Regionais e Subregionais de Integração na América Latina e no Caribe na área Econômico-comercial, Montevidéu, 6 e 7 de abril de 2010; na Reunião entre Mecanismos Regionais e Subregionais de Integração na América Latina e no Caribe na área Produtiva, Caracas, 5 e 6 de maio de 2011; na Reunião entre Mecanismos Regionais e Subregionais de Integração na América Latina e no Caribe na área Social e Institucional, Caracas 10 e 11 de junho de 2011; na Reunião de Conclusões entre Mecanismos Regionais e Subregionais de Integração na América Latina e no Caribe, Caracas, 11 de junho de 2011; na Reunião de Coordenação das Iniciativas Regionais nas áreas de Infraestrutura para a Integração Física de Transporte e Telecomunicações e Integração Fronteiriça, México, 24 e 25 de março de 2011; na Reunião Regional de Mecanismos Latino-americanos e Caribenhos sobre Assistência Humanitária, Panamá, 30 e 31 de maio; e na reunião Regional sobre Proteção aos Migrantes, Peru, 26 e 27 de junho de 2011; cumprindo assim o Programa de Trabalho de Caracas para a implementação dos mandatos da CALC estabelecidos nas Declarações de Salvador da Bahia e de Cancun, bem como no Plano de Ação de Montego Bay, e acordados pelos Ministros da Relações Exteriores em 3 de julho de 2010 para o período 2010-2011;

32. Dar andamento à CELAC como um mecanismo representativo de concertação política, cooperação e integração dos Estados latino-americanos e caribenhos e como um espaço comum que garanta a unidade e a integração de nossa região;
33. Reafirmar que o propósito comum da integração, da unidade e da cooperação no âmbito da CELAC baseia-se nos acervos herdados pelos princípios compartilhados e nos consensos adotados na Cúpula da América Latina e do Caribe sobre Integração e Desenvolvimento (CALC) e no Mecanismo Permanente de Consulta e Concertação Política, Grupo do Rio, que após um trabalho frutífero suspendem formalmente suas ações para permitir o início da CELAC.
34. Incorporar o Plano de Ação de Caracas 2012 como parte integrante desta Declaração, com o objetivo de pôr em prática nosso compromisso político de defender a unidade, a integração, a cooperação, a complementaridade e a solidariedade;

35. Aprovar o “Estatuto de Procedimentos da CELAC”, como parte integral da presente Declaração, iniciando finalmente a execução da sua organização e funcionamento.

36. Convidar à Presidência Pro Tempore da CELAC a que, no exercício de seu mandato, execute o Plano de Ação de Caracas 2012, especialmente no tocante aos eixos temáticos nas áreas social, ambiental, energética, econômica, cultural, bem como noutras áreas prioritárias determinadas no Plano de Ação de Caracas. Da mesma maneira, encomendar aos Ministros das Relações Exteriores a formulação de propostas para designar os recursos materiais e financeiros necessários, com base nos critérios de máxima efetividade e austeridade estabelecidos no documento de procedimentos da CELAC.
37. Comprometer a vontade de nossos governos para instruir os mecanismos e organizações regionais, para que promovam entre eles a comunicação, cooperação, articulação, coordenação, complementaridade e sinergia, quando corresponda e através de suas respectivas direções, a fim de contribuir com a consecução dos objetivos de integração colocados nesta Declaração, segurando o ótimo uso dos recursos e a complementaridade de esforços.

38. Reafirmar o convite para celebrar a Cúpula da CELAC na República do Chile em 2012.

39. Celebrar na República de Cuba a Cúpula da CELAC em 2013.

40. Acolher a realização da Cúpula da CELAC em 2014 na República da Costa Rica
.
41. Aprovado em Caracas, cidade natal do Libertador Simón Bolívar, República Bolivariana da Venezuela, em 3 de dezembro de 2011.