quarta-feira, 2 de março de 2011

Contencioso entre CUT e Força Sindical

A votação do novo salário mínimo precisa ser avaliada em dois aspectos. O mais importante foi a aprovação de uma política duradoura de valorização do salário mínimo. Durante todo o governo Dilma está assegurada a fórmula "inflação + PIB de dois anos anteriores" para reajustar o mínimo.

O ponto fora da curva foi a manutenção do valor de R$ 545,00 proposto pelo governo para o ano de 2011. A última proposta das centrais sindicais, não aceita pelo governo, foi a de demandar um novo valor, de R$ 560,00, a título de antecipação do reajuste a ser concedido o ano que vem.

A matéria em tela, apesar das disputas, não deveria gerar tantas polêmicas, mas foi o estopim para a deflagração de uma guerra de declarações entre o deputado federal e presidente da Força Sindical, Paulo Pereira, e o presidente da CUT, Artur Henrique.

Incomodada com a visibilidade maior adquirida pelo Paulinho, os dirigentes da CUT  resolveram demarcar de forma mais acentuada com a Força Sindical, parece que com o aval da cúpula petista, insatisfeita pelo voto dissidente de vários deputados do PDT na votação do salário mínimo.

Neste último período a CUT vem ensaiando carreira solo. Pronunciou-se contrária ao 1º de maio unificado e exibe uma postura tendente a minar com a unidade alcançada pelo Fórum das Centrais. Relançar a tese de extinção da contribuição sindical caminha nessa direção.

As declarações do presidente da Força também não jogam água no moinho da unidade. Essa situação toda tem incomodado as lideranças responsáveis do movimento sindical no país. A preocupação desses segmentos é assegurar a manutenção da grande unidade alcançada e os notáveis êxitos alcançados.

A realização de seis marchas unitárias e a conquista do acordo de valorização do salário mínimo, a força adquirida para a luta pela redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais sem redução do salário e o esforço para acabar com o fator previdenciário são exemplos emblemáticos da importância da unidade.

Além disso, as centrais sindicais deram um salto de qualidade na elaboração programática ao aprovar a Agenda da Classe Trabalhadora na histórica Conferência realizada no dia 1º de junho do ano passado, no Pacaembu, com quase 30 mil participantes.

Tudo isso se associa com a terceira vitória popular, com a eleição da presidenta Dilma. Para adquirir protagonismo e fazer avançar a luta por um projeto nacional de desenvolvimento com valorização do trabalho, a unidade e a luta das centrais são fundamentais, precisam ser preservadas.

Para além de opiniões diferenciadas sobre determinadas questões, o grande desafio é lutar unitariamente pela viabilização da Agenda aprovada na Conferência Nacional da Classe Trabalhadora. A prática concreta dos últimos anos não pode ser fraturada por motivações menores.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

O Discurso do Rei

Depois de assistir "O Discurso do Rei", fui tentado a ler algumas coisas sobre o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte. Coisa meio confusa. Começa pela composição de tal Reino, com quatro países que não são países: Inglaterra, Irlanda do Norte, Escócia e País de Gales.

Como eles disputam a Copa do Mundo como países soberanos - não sei a origem desse status esportivo privilegiado - muita gente se confunde. Mas eles são representados nos organismos internacionais como um único país - o Reino Unido.

O País é uma monarquia hereditária e não-laica (só anglicanos podem ser reis ou rainhas). Lá tem uma Câmara dos Lordes, não eleita e com cargos vitalícios, (vide a pomposa foto) com funções legislativas e até judiciais - é a mais alta corte de apelação para a maioria dos processos.

Para ser membro da Câmara dos Lordes, ou se é da cúpula da igreja anglicana ou membro da fina flor da elite. Antes prevalecia até o direito hereditário automático para compor a Câmara Alta do Reino Unido. Essa Câmara é uma contraposição da elite à Câmara dos Comuns, esta eleita por um mandato de cinco anos.

Falo tudo isso porque, para surpresa de muitos, inclusive minha, o filme "O Discurso do Rei" ganhou o mais badalado trofeu do cinema mundial, o Oscar, o prêmio da Academia dee Artes e Ciências de Los Angeles. O filme, na verdade, faturou quatro estatuetas, glória máxima do cinema.

O leitmotiv do filme é o esforço do Rei George VI para superar sua gagueira e poder falar com os súditos. Um fonoaudiólogo heterodoxo da Austrália tenta tratar o rei. Sua Majestade precisava fazer um imponente discurso sobre a declaração de guerra do Reino Unido contra a Alemanha. Gaguejar seria sinônimo de fraqueza, tibiedade. É por aí que o filme rola.

O Rei George VI foi pai da atual Rainha Elisabeth. O filme, como anota alguns, pode ser enquadrado no esforço de reabilitar os valores da monarquia e dar um sentido épico aos remanescentes do antigo Império Britânico.

Um crítico disse que os britânicos são fascinados pelos seus monarcas e que os americanos são fascinados pelos britânicos, talvez uma relação saudosista e subserviente do período colonial. O fato é que a soma desses dois fatores - mais um lobbyzinho básico para essas horas, levou o filme a conqusitar o cobiçado  prêmio.

Família Real, Câmara dos Lordes, sucessão hereditária, cargos vitalícios, religião estatal,  tudo isso são marcos da civilização ocidental? Se essa herança anacrônica da Idade Média é admitida como civilizada, onde repousa a autoridade moral e política dos que chamam de bárbaros e fundamentalistas os povos árabes ora em convulsão?

O Espírito das Leis

Nesta segunda-feira eu participei de uma reunião com a diretoria do Sindicato dos Marceneiros de São Paulo. Minha tarefa era falar da atual conjuntura e seus reflexos para a luta dos trabalhadores. Uma questão, como era de se esperar, veio à tona com força: o novo salário mínimo.

Dois dirigentes da entidade, que é filiada à CTB, mostraram-se indignados com o aumento do mínimo para R$ 545,00, principalmente porque, na opinião deles, os parlamentares haviam reajustado os seus próprios vencimentos poucos dias antes.

Mesmo sem ser especialista em Montesquieu, eu procurei demonstrar aos sindicalistas que, no atual sistema político predominante em  boa parte do mundo,  baseado nos ensinamentos da celébre obra do pensador francês - "O Espírito das Leis" - os estados tem três poderes independentes e harmônicos.

Para se criar um sistema de pesos e contrapesos, o Judiciário, o Executivo e o Legislativo devem ter força equivalente, reza a teoria. Isto se estende, entre outros fatores mais importantes, à equivalência salarial. Por isso eu fiz o papel difícil de considerar que é falsa a contraposição entre o valor do salário mínimo e o salário dos congressistas.

No meu arrazoado, eu disse que no sistema capitalista, acima desses três poderes, tem um poder muito maior, que é o poder do capital. Por isso, a verdadeira contradição a ser enfrentada é aquela existente entre o capital e o trabalho, ou na sua expressão mais genérica, lucros x salários.

Tentei mostrar que há uma relação de causa e efeito entre os R$ 13 bilhões de lucro do Itaú em 2010, o salário mínimo praticado no país e a política macroeconômica pró-rentista. Eis aí o principal gargalo a ser superado para um desenvolvimento mais forte, com valorização do trabalho.

Vendo a floresta e não apenas a árvore, percebe-se que atacar o Congresso e o salário dos congressistas não ajuda a ter uma compreensão mais ampla e justa dos interesses dos trabalhadores. Estes precisam conhecer os verdadeiros alvos a serem atacados, para não gastar munição com objetivos errados ou secundários.

Não sei se Monstesquieu subscreve a tese, mas é como eu a vejo.