Começa a ganhar corpo o debate sobre o papel da indústria no Brasil. Tudo começa com a constatação de que a produção industrial tem perdido espaço no PIB brasileiro, principalmente a partir da década de 90 passada (Collor, FHC). O centro da polêmica atende pelo nome de desindustrialização.
Alguns estudiosos afirmam que todos os países, sejam eles desenvolvidos ou os chamados emergentes, só conseguiram sustentar um crescimento acima de 5% anual com base preponderante na indústria. A desindustrialização seria, portanto, um passaporte carimbado para a insustentabilidade do crescimento.
Análise feita pelo articulista Rogério César de Souza , no Portal Estadão desta segunda-feira, diz que a indústria nacional perde competividade devido ao pequeno crescimento da produtividade, custos de infraestrutura inadequada, carga tributária elevada e forte valorização do real.
Em 20 anos, segundo ele, a indústria recuou sua participação no PIB de 27% para 16%, Teme-se, por essa ótica, que o Brasil seja acometido da famosa "doença holandesa", termo usado para designar países que exportam recursos naturais e sofrem declínio em seu setor manufatureiro.
O professor de Economia da USP, Alexandre de Freitas Barbosa, interpreta o fenômeno de forma diferente. Ele sustenta que não se pode falar em desindustrialização em um país que, em cinco anos, gerou 2,5 milhões de novos empregos industriais e ainda bate recordes na produção de automóveis.
Para ele, o que falta ao Brasil é uma estratégia nacional de desenvolvimento clara, para além das questões imediatas. Polêmico, o professor acha que a elaboração dessa nova estratégia de desenvolvimento precisa superar alguns fantasmas que povoam a cabeça dos economistas brasileiros.
Haveria, em sua opinião, o fantasma neoliberal, que só pensa em ajuste fiscal como panaceia para todos os males da economia, e o fantasma dos economistas de esquerda, que vêem financeirização e desindustrialização como os dois problemas econômicos centrais.
A briga pela industrialização no Brasil vem de longe. Em 1785, para citar um exemplo emblemático, Dona Maria I baixou um alvará proibindo a produção industrial no Brasil. Só em 1808, com a chegada da Família Real ao país, tal medida foi revogada.
A industrialização de fato no Brasil começa com o fim do tráfico internacional de escravos (1850), que libera recursos para a indústria, e com a cafeicultura e a imigração, que propiciam o surgimento de mão-de-obra assalariada do país e a formação de mercado consumidor.
O incremento industrial brasileiro se beneficia das grandes crises mundiais (guerras mundiais e a crise de 1929). Com a Revolução de 30, liderada por Getúlio Vargas, o perfil da economia do país se altera, com política industrializante e a substituição dos imigrantes por mão-de-obra nacional.
Com JK e seu Plano de Metas, a indústria cresce pela via da internacionalização da nossa economia, com a abertura para as multinacionais.O tripé econômico do país é formado pelas empresas estatais, pelo capital privado nacional e pelas multinacionais.
Com isso, o Brasil se industrializou, se urbanizou e se tornou uma das dez maiores economias do mundo. Apesar das desigualdades sociais e regionais, o período de 1930/1980 pode ser considerado o período de ouro do capitalismo brasileiro.
A euforia, no entanto, desaba na tristemente famosa década perdida (anos 80 do século passado). Piora ainda mais na década seguinte, com a hegemonia do ideário neoliberal. O Brasil retroage em todas as áreas. Nesse período, o país enfrenta uma estagnação sem precedentes em sua história.
Com o início do governo Lula, em 2003, volta à ordem do dia o debate sobre um novo projeto nacional de desenvolvimento. Esse projeto precisa se ancorar em quatro pilares básicos: democracia, soberania nacional, integração latino-americana e progresso social.
Com todas as vicissitudes do seus oito anos de governo, Lula teve o mérito de interromper a aplicação do neoliberalismo e iniciar uma nova fase no país. Em um ambiente democrático, o país voltou a crescer e a enfrentar as heranças históricas de desigualdades sociais e regionais.
Com o governo Dilma, a etapa é outra. O Brasil precisa realizar reformas estruturais e aprofundar o ciclo progressista inaugurado pelo presidente Lula. Um gargalo essencial a ser superado é o problema do do crescimento econômico sustentado e o papel da indústria como sustentáculo dessa nova fase.
Uma pergunta fica no ar: o Brasil corre o risco de ser vítima da doença holandesa, exportador de produtos básicos, de baixo valor agregado, com grande valorização cambial e setor manufatureiro menos competitivo e em retração? Está aberto o debate.
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