Em artigo publicado neste domingo na Folha de S. Paulo, o professor André Singer retoma a tese segundo a qual as placas tectônicas sobre as quais se assentam as classes socias brasileiras se movimentaram, engendrando, em consequência, novos titulares da representação política do povo no Brasil.
Para o professor, Lula promove uma revolução distributivista silenciosa, sem rupturas e em ordem, angariando, com isso, a simpatia e adesão do povo a seu projeto político, sem assustar as elites dominantes, também benefciárias do modelo policlassista do atual governo.
A manutenção do conservadorismo macroeconômico - juros altos, câmbios flutuantes e superávits primários elevados - é mitigada por políticas desenvolvimentistas - créditos públicos, grandes obras, etc. e por políticas de transferência de renda - Bolsa-Família, crédito consignado, valorização do salário mínimo.
Nesse contexto, assevera Singer, o projeto lulista, agora encarnado na eleição de Dilma, se mantém enquanto conseguir um nível razoável de crescimento do PIB. Com isso, haverá os meios necessários para se bancar a chamada política "social-desenvolvimentista".
Só um segmento minoritário dos estratos médios, particularmente fortes em estados como São Paulo, insistem em ser refratários a esse projeto. Para eles, eleitores tucanos em potencial, o discurso moralista-udenista ainda tem repercussão. Isso talvez explique a sobrevida do PSDB paulista, provavelmente o último bastião de resistência ao lulismo.
Essa vasta maioria da população dialoga diretamente com a liderança de Lula, sem a intermediação das representações formais da socidade como sindicatos, entidades populares e diversos tipos de associações que, tradicionalmente, constituem a base organizada da esquerda.
Claro que essa constatação precisa levar em conta que o governo Lula tem o apoio majoritário dos chamados segmentos populares organizados. Centrais sindicais, organizações estudantis e centenas de movimentos sociais participam de conferências e atividades propiciadas pelo atual governo e se engajam na formulação de políticas para os diversos setores governamentais.
Parece que é importante, mas insuficiente, a opinião de que apenas as massas desorganizadas, por baixo, e os beneficiários capitalistas da atual política econômica, pelo alto, sejam os responsáveis pela imensa popularidade do presidente Lula e sua capacidade inquestionável de tornar vitoriosa a própria sucessão.
As dificuldades de diálogo com alguns estratos médios da população devem estar mais ligadas à artilharia pesada da mídia contra o governo, sem contestação à altura. Até porque, bem pesadas as coisas, é difícil encontrar algum setor da sociedade que não tenha experimentado algum tipo de usufruto do atual "feel good factor".
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